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A nova estratégia da China para a América Latina

A atuação de Pequim está mudando de uma era de grandes empréstimos e projetos de infraestrutura para um envolvimento mais direcionado e estratégico.
BEIJING, CHINA - MAY 13: Chinese President Xi Jinping and Brazil's President Luiz Inacio Lula da Silva attend a welcome ceremony at the Great Hall of the People on May 13, 2025 in Beijing, China. The summit includes China's key Latin American trade partners, and comes as Beijing and Washington work on defusing a trade war. (Photo by Tingshu Wang - Pool/Getty Images)
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A nova estratégia da China para a América Latina

Este artigo foi adaptado da edição especial da AQ sobre China e América Latina | Read in English | Leer en español

A China entrou em uma nova fase do seu envolvimento com a América Latina.

É uma fase ainda caracterizada por uma ampla busca por matérias-primas e mercados, características da relação há mais de três décadas. Enquanto a China investe e comercializa matérias-primas latino-americanas e constrói mercados em toda a região para tudo, desde brinquedos e têxteis até linhas de transmissão de ultra-alta tensão e serviços em nuvem, o comércio geral continua a crescer.

Ao mesmo tempo, a relação está evoluindo rapidamente para uma abordagem mais direcionada e estratégica. Apesar de toda a atenção recente dada aos projetos de infraestrutura da iniciativa Belt and Road Initiative (BRI) da China, a participação relativa da América Latina nos investimentos do plano está caindo pelo terceiro ano consecutivo. A região recebeu pouco mais de 1% dos gastos globais de construção da BRI de Pequim e 0,4% dos investimentos externos no primeiro semestre de 2025. O crescimento do investimento estrangeiro direto (IED) chinês na região também está desacelerando.

Ainda não se sabe se essas tendências se manterão. Mas os dias em que Pequim inundava a região com empréstimos e projetos de infraestrutura em grande escala podem ter chegado ao fim, ou pelo menos diminuído, sendo substituídos por um envolvimento mais deliberado e um foco em setores específicos de interesse chinês, especialmente na parte mais alta da cadeia de valor.

A mudança de foco entre as empresas chinesas está sendo impulsionada por uma variedade de fatores e é evidente em vários continentes. As políticas econômicas da China estão mudando em meio aos esforços de Pequim para alcançar taxas moderadas de crescimento econômico, assim como as percepções sobre a China na América Latina e em outras partes do mundo. Enquanto isso, mudanças radicais na política econômica e externa dos Estados Unidos sob o presidente Donald Trump estão recalibrando as relações entre Washington e Pequim — com consequências para os laços interamericanos e entre a China e a América Latina.

Nesse contexto, este parece ser um momento crucial para reavaliar a evolução das relações entre a China e a América Latina, o que exige que os governos latino-americanos elaborem políticas voltadas para o futuro e em sintonia com as novas tendências. Isso também pode levar Washington, que tem buscado contrariar a influência de Pequim na região, a refletir criticamente sobre a eficácia de suas próprias estratégias e até que ponto elas se alinham com a realidade atual.


Uma nova fase

A relação entre a China e a América Latina é definida tanto pela continuidade quanto pela mudança. A demanda da China pelos recursos naturais da região, que vão desde produtos extrativos até produtos agrícolas, continua a impulsionar o comércio, que atingiu US$ 518,47 bilhões em 2024, um aumento de 6% em relação ao ano anterior. A China foi o destino de cerca de um terço das exportações minerais da região em 2023. A região forneceu aproximadamente 75% do total das importações de soja da China e quase todas (98%) as importações de carbonato de lítio em 2024.

A América Latina também é, há muito tempo, um mercado vital para os produtos chineses. Mesmo com as exportações da China para a região caindo 2,4% em 2023, as exportações chinesas de veículos elétricos para a América Latina cresceram 55%, de acordo com dados da Alfândega da China, totalizando US$ 4,2 bilhões. As exportações da China para a América Latina subiram novamente — em 13% — entre 2023 e 2024, incluindo vendas consideráveis de produtos de alta e baixa tecnologia. O México, a Colômbia e outros países também continuaram a importar quantidades substanciais de máquinas industriais, equipamentos de telecomunicações e eletrônicos de consumo da China, contribuindo para o crescimento constante das exportações nesses setores. Além disso, se as tarifas dos EUA sobre produtos chineses persistirem, as exportações chinesas poderão ser cada vez mais desviadas para os mercados latino-americanos.

Além disso, a aproximação da China com a América Latina e outras regiões está há anos intimamente ligada à sua agenda econômica interna. A BRI, lançada em sua forma inicial em 2013 e estendida à América Latina em 2018, foi tanto uma ferramenta para enfrentar os desafios econômicos estruturais da China, como o excesso de capacidade de construção e produção de aço, quanto uma iniciativa diplomática ou de política externa. Por volta de 2013, quando a BRI começou a tomar forma e os preços globais das commodities caíram, o envolvimento da China com a região concentrou-se em projetos de infraestrutura de grande escala — frequentemente financiados por bancos chineses e executados por empresas de construção chinesas.

As prioridades da China em matéria de segurança alimentar e energética, juntamente com sua agenda de crescimento mais ampla, continuam sendo fundamentais para seu envolvimento com a América Latina. Mas vários fatores, incluindo lições aprendidas por atores chineses e regionais, estão redefinindo os contornos da relação. Essas mudanças são particularmente evidentes nos fluxos de capital chinês para a região, à medida que as empresas chinesas se concentram em setores de importância estratégica para Pequim e, ao mesmo tempo, buscam cada vez mais oportunidades locais de negócios em toda a região.


Os efeitos atenuantes da política econômica interna chinesa

O recente esforço da China para sustentar um crescimento econômico moderado — apesar dos ventos contrários, como a fraca demanda interna, as pressões demográficas e o alto endividamento — remodelou seu envolvimento no exterior e, por extensão, as prioridades da BRI. Paralelamente às medidas de estímulo interno, Pequim busca uma maior participação no mercado de tecnologias de ponta, tanto nos mercados desenvolvidos quanto nos mercados em desenvolvimento, incluindo a América Latina. Ao mesmo tempo, os bancos e empresas chineses estão, em muitos casos, adotando uma abordagem mais cautelosa e sensível ao risco em relação ao envolvimento com a região, enquanto buscam novos caminhos para a realização de negócios.

Essa mudança é evidente no recente declínio dos empréstimos da China à região e na desaceleração de seus investimentos estrangeiros diretos (IED). Outrora uma característica marcante das relações entre a China e a América Latina, os empréstimos soberanos, muitas vezes em apoio a grandes projetos de infraestrutura, concedidos pelas duas principais instituições financeiras de desenvolvimento (IFDs) da China — o Banco de Desenvolvimento da China (CDB) e o Banco de Exportação e Importação da China (Ex-Im Bank) — diminuíram drasticamente. Entre 2019 e 2023, a região recebeu uma média de pouco mais de US$ 1,3 bilhão por ano desses bancos, uma queda acentuada em relação ao pico de 2010, quando somente o CDB concedeu quase US$ 25 bilhões aos governos regionais. Em 2023, de acordo com o Banco de Dados de Empréstimos Chineses à América Latina e ao Caribe (Inter-American Dialogue/Boston University), os empréstimos se limitaram a apenas dois empréstimos ao Brasil, totalizando US$ 1,3 bilhão.

Vários fatores ajudam a explicar o declínio nos empréstimos das IFDs chinesas para a América Latina e o Caribe. Um fator importante tem sido a relutância da China em conceder novos créditos à Venezuela, que foi responsável por quase metade (49%) de todo o financiamento das IFDs chinesas para a região desde 2005. A paciência de Pequim com Caracas se esgotou em meio a riscos econômicos e de segurança no país, e nem o CDB nem o Ex-Im Bank concederam empréstimos à Venezuela nos últimos nove anos. Os empréstimos também diminuíram para outros grandes beneficiários, como Brasil e Equador.

Ao mesmo tempo, a demanda por financiamento chinês diminuiu em algumas partes da região. A Jamaica, por exemplo, recebeu 10 empréstimos chineses desde 2005, mas seu esforço bem-sucedido para reduzir a relação dívida/PIB em 40 pontos percentuais em apenas cinco anos diminuiu o apetite do governo por novos empréstimos. O último empréstimo da IFD da China à Jamaica foi em 2017.

Os presidentes Gabriel Boric, do Chile, Luiz Inácio Lula da Silva, do Brasil, Xi Jinping, da China, e Gustavo Petro, da Colômbia, participam da cúpula China-CELAC em maio.
Foto de Florence Lo, Pool/Getty.

As próprias prioridades domésticas da China restringem ainda mais os empréstimos ao exterior. Pequim orientou os bancos estatais a se concentrarem mais no apoio ao crescimento interno, enquanto as empresas no exterior dependem de outras fontes de financiamento para projetos prioritários de menor escala. Novas regras introduzidas em 2023 pela Administração Nacional de Regulamentação Financeira (NFRA) — um órgão do Conselho de Estado que supervisiona bancos e seguros — impõem padrões mais rígidos de gestão de risco que provavelmente continuarão a mitigar a atividade financeira externa da China. Em 2025, a NFRA também introduziu novas diretrizes de gestão de risco de mercado para os bancos comerciais da China, incluindo o Banco da China e o ICBC, ambos ainda ativos na América Latina. Embora não sejam voltadas especificamente para empréstimos no exterior, as regras e o sinal que elas enviam reforçam uma abordagem mais cautelosa e avessa ao risco em relação ao financiamento transfronteiriço.

Junto com o declínio dos empréstimos soberanos, o IDE da China na América Latina também desacelerou. Dados do Inter-American Dialogue indicam uma tendência de queda nos anúncios de projetos chineses nos últimos anos, refletida na redução do IDE em novos empreendimentos e em um declínio mais acentuado nas fusões e aquisições (M&A). O crescimento das M&A chinesas desacelerou pela primeira vez em 2014 e tem caído constantemente desde 2020, com base na média móvel de cinco anos.


Novos focos

Apesar da desaceleração nos financiamentos e nos investimentos, as empresas chinesas continuam ativas na América Latina, concentrando-se em investimentos menores e direcionados, em setores estratégicos, como lítio, produtos de alta tecnologia e tecnologia da informação e comunicação (TIC). A China está buscando fabricar na região em alguns casos, incluindo fábricas de veículos elétricos no Brasil e empresas de peças automotivas em todo o México, todas dependentes da importação de componentes da China. Em outros casos, as empresas chinesas têm como objetivo ser as principais fornecedoras de uma ampla gama de equipamentos e serviços tecnológicos. Investimentos em projetos de cidades seguras, parques solares e projetos de transmissão incorporam tecnologias e padrões chineses e facilitam a exportação de produtos de alta tecnologia da China. Esses e outros acordos estão alinhados com as prioridades de Pequim para um crescimento de alta qualidade e impulsionado pela inovação, levando a uma mudança em direção a um envolvimento seletivo, tanto regional quanto globalmente.

Uma análise recente do Inter-American Dialogue demonstra até que ponto os investimentos da China na América Latina estão focados na chamada “nova infraestrutura” (新基建), um termo evocado mais recentemente pelo primeiro-ministro Li Qiang como um componente-chave da estratégia econômica da China. O termo geralmente abrange os setores — telecomunicações, fintech e transição energética, por exemplo — que Pequim considera amplamente relacionados à inovação.


“Nova infraestrutura”

Na América Latina e no Caribe, o investimento em indústrias de “nova infraestrutura” tem crescido ao longo do tempo, com as TIC (incluindo as ofertas da Huawei em toda a gama de produtos tecnológicos), a tecnologia de energia renovável e, cada vez mais, os veículos elétricos representando a maior parte dessa atividade. As indústrias de “nova infraestrutura”, incluindo a fabricação de veículos elétricos, como a fabricação de baterias, carros e ônibus no México e no Brasil; outras indústrias de ponta, incluindo a fabricação de equipamentos médicos e máquinas; TIC; investimentos em energia renovável, como parques solares na Argentina e no Chile e barragens em grande parte da região; e infraestrutura urbana, incluindo o projeto do metrô de Bogotá, ainda em desenvolvimento lento, representaram 58% (cerca de US$ 3,7 bilhões) do total anual de IED chinês na região em 2022 e mais de 60% do número total de negócios de IED anunciados por empresas chinesas naquele ano.

Certamente, as discussões sobre grandes projetos de infraestrutura apoiados pela China persistem na América Latina. Autoridades chinesas, peruanas e brasileiras estão supostamente discutindo a Ferrovia dos Dois Oceanos com renovado interesse. O Brasil e a China assinaram um acordo para lançar um estudo de viabilidade técnica, ambiental e econômica para o projeto em 2025. Inicialmente promovido por autoridades chinesas em 2014, esse projeto atravessaria o Peru e o Brasil, gerando discussões complexas e provavelmente enfrentando uma ampla oposição pública. Mesmo o há muito abandonado Canal da Nicarágua continua presente no discurso China-América Latina. Em novembro de 2024, na XVII Cúpula Empresarial China-LAC, o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, buscou o apoio da China para uma nova rota proposta para o canal. Outros projetos de grande porte — principalmente o enorme Porto de Chancay, no Peru — são considerados exemplos notáveis do interesse duradouro da China no desenvolvimento de grandes infraestruturas, mas refletem, sem dúvida, as fases iniciais do envolvimento da China na região. O estudo de Chancay começou bem antes da compra de 60% das ações da Volcan pela CO.SCO em 2019. No entanto, novos projetos adjacentes ao Porto de Chancay provavelmente se materializarão, aproveitando o crescimento impulsionado pelo porto.

Em geral, porém, o foco da China, seja no exterior ou em casa, ainda é reforçar o crescimento e a presença no mercado em setores frequentemente de alta tecnologia. Esse foco é evidente mesmo nas negociações de alto nível da China com líderes da América Latina. Durante a visita do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva à China em maio de 2025, a China anunciou planos para um novo centro de energia eólica, solar e armazenamento de energia da CGN Power e um compromisso da Great Wall Motor de investir aproximadamente US$ 1 bilhão em fábricas de automóveis brasileiras, entre outros acordos. Os planos do Tsingshan Holding Group de investir US$ 233 milhões em uma fábrica de fosfato de ferro e lítio no Chile foram anunciados durante a recente visita do presidente chileno Gabriel Boric à China. E as negociações do presidente Xi Jinping em novembro de 2023 com a presidente peruana Dina Boluarte, Luis Lacalle Pou, do Uruguai, e Gustavo Petro, da Colômbia, bem como sua reunião em abril de 2023 com Lula, se concentraram na expansão das já fortes relações comerciais, ao mesmo tempo em que incentivaram a cooperação em setores relacionados principalmente à inovação, incluindo sistemas de mobilidade urbana na Colômbia, produtos farmacêuticos no Uruguai, economia digital, energia e mineração no Peru e 5G no Brasil, entre outras áreas.

Internamente, a China parece estar reforçando essa linha de ação, promovendo políticas de oferta para a manufatura de alta tecnologia e de ponta, a fim de impulsionar as perspectivas econômicas do país. Essas políticas persistem apesar das desvantagens da “involução”, ou seja, a concorrência de preços entre empresas chinesas que obriga as empresas a reduzir continuamente os preços, o que é objeto de muita deliberação nos círculos políticos chineses. Ainda central para a abordagem da China está o que Xi chamou de “novas forças produtivas de qualidade”, ou a busca por alta tecnologia, alta eficiência e alta qualidade para impulsionar o crescimento econômico. Ainda este ano, o Relatório de Trabalho do Governo da China reiterou a importância de desenvolver “novas forças produtivas de qualidade”, com foco em modelos de crescimento de alta tecnologia, alta eficiência e alta qualidade, em busca de um “sistema industrial modernizado”.

Trabalhadores preparam um sedã em uma concessionária da MG Motor Co. na Cidade do México. A empresa, que faz parte da estatal chinesa SAIC Motor, seria afetada pelas tarifas de importação planejadas que o México anunciou em setembro.
Foto de Stephania Corpi/Bloomberg/Getty.

Envolvimento local

Em meio a esse cenário em transformação, a conectividade entre as pessoas — um dos objetivos declarados da Iniciativa Cinturão e Rota — é outro foco crescente para os planejadores da China, seja em apoio a objetivos diplomáticos ou empreendimentos comerciais. Na busca pelo apoio de governos locais para projetos municipais (por exemplo, cidades inteligentes) ou outros projetos, para contornar complicações em nível nacional ou como parte da abordagem frequentemente descentralizada da China para a distribuição de ajuda, grande parte do envolvimento da China está sendo realizado localmente, por meio de uma rede complexa de interações sobrepostas e um elenco caleidoscópico de personagens, com o governo, o Partido, atores quase governamentais e comerciais desempenhando papéis de destaque.

O envolvimento em nível local também está presente nos esforços da China para promover “novas infraestruturas” em toda a América Latina e adquirir lítio e outros minerais e metais relacionados à tecnologia. Os investimentos provinciais da China em lítio argentino estão agora bem estabelecidos, mas no caso de Jujuy, os esforços para acessar esses recursos remontam a um memorando de entendimento de 2010 entre o Serviço Geológico Mineiro da Argentina (Segemar) e o Serviço Geológico da China (CGS), promovendo o intercâmbio científico e workshops de capacitação. Em 2015, a então presidente Cristina Kirchner e o presidente chinês Xi ampliaram essa parceria, formalizando iniciativas conjuntas de pesquisa e treinamento. E, já em setembro de 2017, o CGS, o Segemar e a Universidade Nacional de Jujuy realizaram estudos geológicos para avaliar o potencial industrial das salinas de Jujuy.

Iniciativas locais de longa data também estão em andamento em outros lugares, com o objetivo de estabelecer mercados, facilitar acordos estratégicos e promover a coordenação de políticas, entre outros objetivos.


“Águas desconhecidas”

Os efeitos das muitas tendências em curso na dinâmica China-América Latina — sobre a região, sobre os interesses econômicos da China e sobre a posição de outros parceiros regionais — ainda estão se desenvolvendo e continuarão a ser moldados por uma série de fatores, incluindo mudanças contínuas na política econômica e externa chinesa, respostas regionais e esforços dos EUA para combater o envolvimento de Pequim.

As iniciativas de “nova infraestrutura” da China foram bem recebidas em muitas partes da região, devido ao seu alinhamento com as prioridades de desenvolvimento regional, particularmente em transição energética, adaptação climática e digitalização. Mas se e em que medida a região se beneficiará do envolvimento cada vez mais direcionado da China dependerá em grande parte das abordagens regionais à gerência de recursos, transferência de tecnologia e desenvolvimento de estruturas jurídicas e regulatórias robustas para tecnologias emergentes.

Ao mesmo tempo, as medidas políticas da China podem prejudicar suas relações com partes da região. A estratégia industrial da China — incluindo esforços para descarregar o excesso de capacidade na América Latina e em outros mercados — já encontrou alguma resistência na região. As tarifas sobre o aço impostas pelo México, Chile e Brasil refletem essa dinâmica, enquanto as tarifas sobre veículos elétricos do Brasil em janeiro de 2024 sinalizaram preocupação com o aumento das importações da China. A pressão sobre os fabricantes latino-americanos pode muito bem aumentar, à medida que a China busca aumentar a competitividade em setores como equipamentos médicos e máquinas-ferramentas, onde algumas empresas regionais permanecem ativas.

As avaliações chinesas sobre a viabilidade da América Latina como mercado e parceira também continuarão a moldar as decisões futuras. As atividades no exterior das empresas chinesas estão sendo monitoradas mais de perto, à medida que Pequim “encara terrenos econômicos desconhecidos” e “se aventura em bancos de areia perigosos”, como afirma o documento de “decisões” do 3º Plenário de 2024. Embora a China continue comprometida com o envolvimento em toda a região e com o cultivo de novos mercados e parcerias, é provável que as empresas sigam os caminhos de menor resistência — seja concentrando-se em localidades receptivas na América Latina, seja desviando a atenção para outras regiões. Atualmente, a América Latina está captando uma parcela cada vez menor dos investimentos da BRI da China, representando apenas 1,14% dos projetos de construção e 0,4% do investimento total no primeiro semestre de 2025.

Para todas as partes interessadas — incluindo os EUA, que continuam comprometidos, em teoria, em limitar a influência da China na região — será fundamental compreender tanto a trajetória das relações entre a China e a América Latina quanto o ritmo de sua evolução. No momento, os EUA correm o risco de não enxergar a floresta e ver só as árvores, por assim dizer, ao se concentrarem excessivamente em um subconjunto de projetos chineses relacionados principalmente à segurança nacional ou em uma visão ultrapassada da BRI. O envolvimento da China é dinâmico — alinhado com a evolução da política industrial e dos objetivos de segurança econômica — e, se bem-sucedido, tem como objetivo estabelecer uma posição dominante de mercado para a China em setores estratégicos, ao mesmo tempo em que cultiva o tipo de relações comerciais bilaterais que garantem algum grau de alinhamento político com Pequim. O jogo dos EUA na América Latina — uma abordagem fragmentada e reativa para sabotar projetos específicos que causam preocupação — provavelmente não alterará significativamente essa trajetória e está prejudicando as relações entre os EUA e a América Latina. Há uma necessidade urgente de uma avaliação abrangente e lúcida do progresso e das prioridades da China — uma avaliação que resista a uma visão estática dos interesses globais da China, questione o alcance e os limites da competitividade dos EUA em todos os domínios e defenda a centralidade das parcerias inter-hemisféricas na promoção de objetivos comuns.

ABOUT THE AUTHOR

Margaret Myers

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Myers is a senior advisor to the Inter-American Dialogue, a lecturer at the Johns Hopkins School of Advanced International Studies, and an adjunct researcher at the Núcleo Milenio sobre los Impactos de China en América Latina (ICLAC) in Chile.
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Tags: China and Latin America
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